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sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Fiscalista denuncia voracidade do Fisco


Fernando Carvalhal: a gula do fisco contribui para a
falência das empresas e para o agravamento do desemprego.

As regras mudaram, mas a Direcção Geral de Contribuições e Impostos persiste em penhorar contas bancárias e bens sem ter em conta a realidade da entidade empresarial ou do contribuinte. Quem o denuncia é Fernando Carvalhal, especialista em Direito Fiscal e defensor de 30 pequenas e médias empresas que a voracidade estatal lançou desnecessariamente nos braços da crise.

“As Finanças ainda cobram pela norma antiga, penalizando duramente o contribuinte”, explica o fiscalista. “Neste momento, a Direcção Geral de Contribuições e Impostos (DGCI) obriga os contribuintes a pagarem multas com valores exacerbados, ignorando a norma prevista no âmbito do Orçamento de Estado que entrou em vigor em 1 de Janeiro. Isto é: continua a aplicar o princípio do cúmulo material previsto na passada regulamentação, em vez do cúmulo jurídico já aprovado pelo Executivo para este ano.

Até ao final de 2008, se um contribuinte fosse alvo de várias contra-ordenações teria de pagar o valor da soma aritmética de todas elas. A nova lei, contudo, é clara: “Quem tiver praticado várias con¬tra-ordenações é punido com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas, e que não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.

Mas o Fisco faz orelhas moucas e cobra pela lei antiga. “Este comportamento sufoca as empresas e revela a sofreguidão da entidade fiscal em avançar para a penhora dos bens. Não existe uma justificação plausível para as coimas aplicadas em relação a atrasos nas declarações. Por exemplo, uma empresa que deva 50 mil euros, ao fim de um ano (com os juros e outras alcavalas) já deve perto de 100 mil euros às Finanças. Isto é um exagero e contribui para a falência das empresas e para o agravamento do desemprego”, comenta Fernando Carvalhal.

As histórias de atitudes despóticas das Finanças não têm fim. Uma firma lisboeta sofreu uma multa de 50 mil euros porque o contabilista desapareceu e não declarou o IRC. Automaticamente, o Fisco “caiu em cima” da empresa e, sem querer saber das razões da dívida, pura e simplesmente penhorou as contas bancárias e os bens dos sócios, provocando a falência da empresa. Este caso, idêntico a milhares de outros de norte a sul do País, ilustra com clareza a arrogância fiscal em vigor.

Aliás, sublinha Fernando Carvalhal, “só com atitudes tão discricionárias se podem obter os resultados anunciados pela DGCI no princípio do ano. Foram penhorados, em 2008, por causa de dívi¬das fiscais, 212.365 salários, o que representa um aumento de quase 58 por cento face aos 134.760 ordenados penhorados no ano anterior”. A cruel eficácia da máquina fiscal traduziu-se também na penhora de 308.536 créditos e de 278.801 contas bancárias e produtos financeiros, representando um crescimento superior a 130%. As execuções fiscais renderam à“máquina” estatal 588 milhões de euros.

Todavia, existem casos ainda mais gritantes. As Finanças estão a cobrar dívidas fiscais a empresa fornecedoras do Estado que não conseguiram cumprir com as suas obrigações fiscais porque... o Governo não lhes pagou os serviços prestados! É o caso, por exemplo, dos fornecedores do Serviço Nacional de Saúde. Segundo foi recentemente divulgado, o Fisco mandou penhorar os créditos de todos os fornecedores do Serviço Nacional de Saúde com impostos em atraso. Antes de pagar as dívidas aos fornecedores do Estado, como se comprometeu fazer até Abril deste ano, o Governo quer reaver o que é seu”, sublinha Fernando Carvalhal. A ordem seguiu para todas as direcções distritais de finanças e chefes de repartições do País. Nessa circular, identificam-se as empresas fornecedoras de bens e serviços a estabelecimentos públidos de Saúde que, tendo dinheiro a receber do Estado, também têm impostos em atraso.

Para Fernando Carvalhal, a hipocrisia do sistema é total. Por um lado, fala-se na necessidade de desenvolver o tecido empresarial português mas, por outro, impõem-se regras draconianas no sistema fiscal, quando, dada a crise existente, muitas empresas estarem a utilizar o IVA para pagar ordenados. “Existe um entendimento inaceitável entre as Finanças e as entidades bancárias na penhora das contas. Não é admissível que as empresas vejam as suas contas congeladas na totalidade, quando as finanças só deveriam penhorar o montante em dívida”, refere.

“É um facto que as empresas e as pessoas têm de conhecer a sua situação contributiva. Do ponto de vista das Finanças, existem razões objectivas para penhorar as contas bancárias. Até aqui tudo bem, estamos todos de acordo: o contribuinte tem de regularizar a sua situação contributiva. Mas já não podemos estar de acordo, quando, por exemplo, o Fisco congela os 50 mil euros que estão na conta, quando o contribuinte apenas deve 2 mil euros. Isto causa grandes transtornos de tesouraria a qualquer empresa”, salienta.

Bruno Pacheco, gestor de uma empresa têxtil, é uma das muitas vítimas da sanha persecutória do Fisco. No final do ano passado, as Finanças publicaram um anúncio de penhora num jornal local, “sem terem sequer notificado a empresa da decisão de penhora, e sem responderem a um pedido de reescalonamento do pagamento da dívida em prestações”. “Trata-se de IVA que ainda não recebemos”, acentua, garantindo que a firma detém na sua posse um documento das Finanças válido até Abril, dizendo que nada deve, o que “demonstra que sempre pagou os impostos”.

Na época, o Fisco anunciava que a maioria da maquinaria existente nas instalações da empresa, com sede em Vilarinho, iria ser executada, como chegou a acontecer, colocando “em causa toda a produção” da fábrica de malhas. A penhora que pende sobre os bens da empresa foi emitida pelo Serviço de Finanças de Vila Verde, para pagamento de uma dívida no valor de 28.029,88 euros, sendo 23.364,93 euros de quantia exequenda e 4.664,95 euros de acréscimos fiscais”. Os bens foram já postos à venda pela Administração Fiscal, pelo valor base de 32.382,00 euros, calculado nos termos do artigo 250º do Código de Procedimento e Processo Tributário.

Entrevista de Alfredo Miranda in O DIABO de 30/VI/2009
Fotografia de Octávio Diaz-Bérrio